sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Dia de indefinição (aqui na ilha...)

Caro leitor,

Aqui em Cambridge estamos chegando ao fim de mais um "term" acadêmico, ou trimestre, como me esclareceu minha colega espanhola, Laura, que acabou de voltar à Grã-Bretanha. Ela fez o mestrado aqui na Inglaterra há alguns anos.

Tem muitas coisas acontecendo por aqui. Sempre tem. É difícil escolher. Mil coisas para fazer em Cambridge. Em Londres. Mas não dá para fazer tudo e fica uma frustração meio difícil de ser digerida.

Tenho ido ao máximo de palestras, seminários e sessões que é possível, mas em termos de conhecimento elas não têm contribuído tanto não, mas é ótimo para aprender Inglês! E aprender sobre a cultura inglesa.

Agora há pouco, aqui na Faculdade, vi um pai com um casal de filhos pequenos, e o garoto, Robert, estava escondidinho (e o pai chamando-o) num canto, apertando o botão do elevador. A porta abria, fechava, abria, fechava, e o inglesinho estava lá, descobrindo o mundo.

Sinto-me, várias vezes, como o Robert, porque há vários"botões" a serem descobertos por aqui. E o que tem mais valido a pena nem é o conteúdo, mas o invólucro, pela primeira vez na vida, feliz ou infelizmente. Esta é a minha terceira pós-graduação e chega uma hora que começa a ficar difícil encontrar algo de novo por aqui, ou, se é novo, nem sempre acrescenta. Por isso, vou começar a ir à Universidade de Londres para ver se é diferente.

Aqui, em março, vai acontecer um big festival de ciência. Vi o programa, ontem, e o achei tão sem graça. Encontrei só algumas coisas um pouco interessantes na Faculdade de Química, que fica meio perto daqui de onde moro. Como meu orientador, o Pedro, é químico, um químico que gosta de literatura, confesso que comecei a ter meu interesse despertado para o tema. Acho que vou passar a fazer uns experimentos, quem sabe, para mudar um pouco a vida. Ou para, de vez em quando, fazer sumir algumas pessoas...

Quero dizer que, em uma cultura completamente diferente da nossa, o cérebro trabalha quadruplicadamente para tentar compreender tudo. Ainda quero escrever um texto sobre o programa de doutorado sanduíche da Capes. Apesar de o processo ser muito burocrático, acho que vale muito a pena. Se o cérebro não pifar, o sanduíche é sempre bem-vindo!

Estou me sentindo até orgulhosa, porque, pelo visto, sou a primeira brasileira a vir para cá como Visiting Scholar. Esta semana pedi à Susanah, que trabalha na parte administrativa, para checar essa informação.

Voltando a falar em língua, estou traduzindo o segundo livro do Português para o Inglês para a minha "host" aqui, a Maria Nikolajeva. Desta vez é "Dia de chuva" ou "Rainy day", da Ana Maria Machado. A Maria já visitou o Brasil duas vezes e gosta da literatura brasileira e quer conhecer melhor os livros para poder mostrá-los em sala de aula. Tradução é um negócio muito complexo e dá muito trabalho. Pedi ajuda ao dono da casa onde moro, que me tirou algumas dúvidas, mas daqui para a frente acho que vou ter que me virar.

Enfim, mais uma experiência. Enquanto a tal Elizabeth, que nunca teve que trabalhar na vida, celebra seu jubileu de 60 anos no poder, e a Inglaterra enfrenta uma crise meio disfarçada, vou seguindo a vida porque, mesmo estudando, estudando, estudando, nem sei se vou arranjar emprego quando terminar esse doutorado, porque educação no Brasil vale menos que qualquer coisa que valha muito pouco.

Vou ficar por aqui. Ando com uma preguiça de falar no Brasil. Quando eu voltar, vamos acertar as contas!

Na verdade, não quero ainda voltar. Mas sou obrigada a voltar daqui a uns meses. Até hoje não enviei aquela cartinha à Dilma pedindo bolsas sanduíche de dez anos. Não seria legal? Nem eu sei. No fim das contas, acho que, a qualquer momento, vou acordar animadíssima para pegar o avião de volta. Afinal, não é fácil viver sem comer pamonha e pão-de-queijo! E também até que dá saudade do Português, com todas as suas imperfeições.

Mas isso não quer dizer que eu ame o Brasil. Nunca amei, não que eu me lembre! Isso nem pensar! Eu jamais amaria um País que desrespeita a própria Constituição, que desrespeita o Estatuto da Criança e do Adolescente, que aceita fora das salas de aula milhares de crianças que vão engrossar as filas de analfabetos; que têm um partido como o PSDB no poder. Nunca! Eu não escolhi ser brasileira. Só me resta conviver com essa fatalidade.

Até!
Rosane.
Cambridge, 24 de fevereiro de 2012.

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