sexta-feira, 2 de março de 2012

Rompendo fronteiras. Será?

Leitor,

Hoje pela manhã voltei à biblioteca do Homerton, onde há uma parte dedicada só à literatura infantil. Tirei umas fotos e, à noite, vou pô-las no site. Espero!!!

Como é comum a todas as bibliotecas, ou à maioria delas, aqui também poucos estudantes as usam. Mas o Homerton, do qual nasceu a Faculdade de Educação, é um dos colleges mais respeitados por aqui, no Reino Unido, e a Faculdade de Educação é uma referência em pesquisa sobre literatura infantil.

A biblioteca do Homerton é muito moderna. A da Faculdade de Educação é belíssima, pois o prédio foi inaugurado há poucos anos, mas o sistema de empréstimo de livros é ancestral. A gente tem que mostrar o livro para a atendente, para que ela faça tudo. Depois é possível renovar on-line, mas temos que enviar e-mail. Não consigo muito entender como tanta modernidade convive com alguns atrasos...

Ontem, estava pensando em como Cambridge tem uma estrutura de alto nível, se comparada com as nossas universidades brasileiras. E eu que achava que a Unicamp fosse top dos tops! Claro que há coisas na Unicamp que estão à frente daqui, ou no mesmo nível, sei lá. Mas, por outro lado, também pensei que Cambridge tem mesmo que ser de alto nível, pois os estudantes pagam caro para estar aqui. No Brasil, o desleixo é total. E olha que USP e Unicamp ainda são referências. O problema é o tal do PSDB, mas nem quero falar nessa gente agora.

Na verdade, o que me incomoda na Unicamp nem é tanto a questão da estrutura física, mas a do conhecimento. Estou cursando minha terceira pós-graduação lá - Jornalismo Científico, no Labjor; mestrado, na Faculdade de Educação; e estou indo para o fim do meu doutorado, iniciado em 2008. Nesse tempo, conheci pessoas, fazendo pós-graduação, que, se fosse a professora delas, não as teria deixado sair do Segundo Grau.

Não sei como eles são selecionados! Muitos deles mal sabem ler. E isso não é exagero. Infelizmente, tem muito disso na Unicamp. Tive contato, nesse tempo, com professores muito bons e bons, mas posso contá-los nos dedos. Durante o doutorado, quando tinha que cumprir os créditos, fiz uma disciplina com uma professora que já foi até premiada. As aulas dela eram muito esquisitas, vazias, e, ao final, ela pediu que escolhêssemos um tema e desenvolvêssemos um texto.

A maioria dos alunos "desertou", como ela mesma nos dizia. E o pior: ela dizia isso rindo. E os ditos cujos dos alunos "desertores" também riam. Somente eu e uma outra aluna cumprimos a tarefa ao pé da letra. Final da história: a professora deu "A" para todo mundo. Até hoje ficou engasgado na minha garganta esse episódio. Achei uma falta de respeito. E, infelizmente, não disse à professora (difícil, né, nomear alguém assim de "professora") sobre a minha indignação.

E são esses colegas "desertores" que se gabam dos títulos de mestres e doutores pela Unicamp. E eles têm "A" no seu histórico escolar. E um monte de gente pensa que a Unicamp é melhor do que uma universidade lá dos confins do Norte, Nordeste e do Centro-Oeste. Será que é tão melhor assim?

Enfim, gostei muito da minha experiência em São Paulo e pode ser que eu passe o resto da vida lá. Mas acho o mundo acadêmico por lá, com algumas poucas exceções, muito arrogante. O Brasil são vários países dentro de um só. São Paulo são vários "são paulos" dentro de um só. Acho que a mentalidade, em geral, ainda é distorcida. E continuo a me ESPANTAR com tantos mestres e doutores que se formam pelo Brasil afora e que são analfabetos. Ou quase isso. E muito arrogantes. Não menos que isso.

Ah, e só um detalhe: eu me formei na Universidade Federal de Goiás (UFG). Por incrível que pareça, lá em São Paulo muita gente pensa que Goiás é uma grande roça. Fico encabulada com a visão limitada de muitas pessoas. Sei lá, eu tenho birra de São Paulo. Mas é uma birra produtiva. É ela que me move para estar perto daquilo que me incomoda.

Na verdade, eu sou brasileira. Mas, infelizmente - ou felizmente, ainda não sei! -, ninguém me identifica como tal aqui na Europa. Perguntam-me se sou espanhola ou italiana. Eu queria ter cara de brasileira. Será que nós, brasileiros, não temos uma identidade muito própria? Sim! Acho que temos. É que a mistura de raças dificulta um pouco a identificação. Sei lá, acho isso meio confuso. Quando visitei a Bahia, um vendedor de quadros, na rua, começou a conversar comigo em Inglês, porque achava que eu fosse estrangeira. Mas eu me sinto estrangeira no Brasil muito mais do que aqui - NO ESTRANGEIRO.

Acho isso péssimo. É uma situação de não-pertencimento e vou explicar o porquê, pois tenho certeza de que muitos brasileiros devem sentir o mesmo. É a sensação de não ter encontrado o lugar na sociedade, por não viver numa sociedade que seja igualitária. Para mim, sem respeito à Constituição, nada está feito. Por outro lado, conheço brasileiros com uma ótima condição de vida e que "AMAM" o Brasil. Por quê? Porque estão se lixando para os problemas sociais. Porque acham que, estando suas vidas boas, o resto é que se dane. Acho isso tão absurdo. Mas isso é tão comum no Brasil...

Eu sou estrangeira em São Paulo! Ser de Goiás é ser estrangeira em terras paulistas. Eu sou uma estrangeira em São Paulo. Eu sou uma estrangeira em Cambridge. E eu sou uma estrangeira em Goiás. Mas, aqui, dentro de mim, minhas raízes vão se ramificando. Mas ninguém precisa saber quem eu sou. Saber pra quê?

Chega de elucubrações ou lucubrações! E também escrever em Português dá trabalho demais. Êta língua complicada. Quanto mais a gente a usa, mais dúvidas aparecem.

*Não sei se é porque o tema abaixo é ciência, mas essa palavra, "elucubração", me fez lembrar de choque, de choque elétrico. Vou pesquisar sobre.

_____________________________________________________________________

Vai acontecer, de 12 a 25 de Março, o Festival de Ciência de Cambridge, ou Science Festival - Breaking boundaries". Eu traduziria para o nosso bem brasileiro "Rompendo fronteiras", porque "quebrando" fica meio esquisito. Na verdade, ainda não entendi bem o que eles querem dizer com isso. É um slogan meio vago. Pretendo participar de algumas atividades. Há várias, organizadas para adultos e crianças.

____________________________________________________________________

Li, hoje, que em São Paulo o calor está insuportável. Eu não queria voltar para São Paulo, claro! Um ano na Europa é muito pouco. Quando a gente começa a se adaptar, já é hora de fazer as malas. Voltar para o Brasil é tão sem graça. Depois de tanto tempo vivendo lá, ainda sinto o Brasil tão pouco entranhado em mim. Como já disse, não morro de amores pela Europa, mas gostaria de estar aqui por mais uns anos, para me embrenhar mais nessa cultura. O Brasil é um daqueles temas difíceis de ruminar. Não acredito no Brasil. Acho que, por isso, me tornei jornalista, professora e, um dia, quiçá, me autodenominarei (com ou sem hífen?), educadora. O Brasil é um mal necessário! Não tem jeito. Meu visto termina no começo de julho. TENHO que voltar. É melhor não pensar muito nisso. MAS EU PENSO!

(Descartes disse que quem pensa logo existe). Não acho muita graça nele. Mas confesso que gosto da dúvida. Gosto de duvidar. De tanto ver tanta gente dona da verdade, a mensagem mais rica que extraí do mundo científico é que eu NÃO quero ser como essas pessoas. E tomara que eu nunca seja!

Lendo Carl Rogers e Paulo Freire acho que gosto de pensar que sou apenas um processo. Sou o estar sendo. É o tal processo dialético. Prefiro ser assim. Não achar que aquilo que penso é a maior das verdades. Mas achar que pode ser verdade apenas para mim. Pelo menos hoje. Sempre:

TESE - ANTÍTESE - SÍNTESE.

Acho isso tão bonito. Retomarei o assunto dia desses.

Até!
Rosane.
Cambridge, 2 de março de 2012.

Nenhum comentário:

Postar um comentário